27 de agosto de 2022
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ENTREVISTA AMÉLIO GODOY-MATOS: “Ninguém perde por esperar o nosso congresso”

Entre 8 e 10 de junho do próximo ano, o Rio de Janeiro sediará o XX Congresso Brasileiro de Obesidade e Síndrome Metabólica, o CBOSM 2023.

Presidente do evento, o endocrinologista Amélio Fernando Godoy-Matos, professor da pós-graduação em Endocrinologia da PUC-RJ, é uma figura cuja trajetória se confunde com a da própria Abeso. Aliás, o professor Godoy-Matos foi o terceiro presidente da nossa associação.

Em entrevista, ele admite: “Houve um período em que andei bem decepcionado, tanto que cheguei a abdicar de participar de alguns congressos”. Indagado sobre o motivo, ele é direto ao dizer que era fatigante estudar tanto uma doença crônica tão séria sem conseguir ver tratamentos efetivos para ela. “E o pior: notar que, apesar dos meus esforços e o dos meus colegas, estávamos sendo suplantados por pessoas sem a menor ética, nem respeito pelos pacientes com obesidade, que até hoje saem propagando promessas milagrosas sem o menor cabimento.”

Apesar de esses supostos tratamentos sem qualquer evidência científica ainda terem bastante popularidade — com o agravante do advento das redes sociais, capazes de espalhar fake news sobre emagrecimento como o vento faz com a poeira —, pelo tom de voz do endocrinologista ao falar sobre o CBOSM 2023, dá para sentir que sua animação está de volta.

Abeso — O senhor participa dos congressos da Abeso desde o início. Como é ver a trajetória desses eventos?

Amélio Godoy-Matos — Na realidade, quando mal tinha sido criada em 1986, a Abeso já criou o Simpósio Internacional sobre Obesidade (SISO) para chamar a atenção da comunidade científica brasileira sobre essa doença que naquela época, no nosso país, nem era muito reconhecida pelos profissionais de saúde como tal. Em 1988, foi realizada uma segunda edição em Curitiba e me orgulho de ter organizado o terceiro simpósio, em 1989, no Rio de Janeiro. 

Nessa ocasião eu, que sempre tive uma veia de comunicador, resolvi criar uma espécie de subtítulo, um mote: “Inocente ou culpado?”. Ele poderia ter várias interpretações e fizemos reflexões sobre todas elas ali: o paciente, ele seria inocente ou culpado por seu excesso de peso? O médico, ao ignorar essa condição, seria inocente ou culpado? O estilo de vida…? O ambiente em que o paciente estava…? E assim por diante.

A partir dessa terceira edição do SISO, o evento revelou a necessidade de crescer, ganhar corpo. Então realizamos, também no Rio de Janeiro, o I Congresso Brasileiro de Obesidade. Ele viria a incorporar a Síndrome Metabólica na programação e no próprio nome alguns anos depois.  

Agora que o nosso congresso acontecerá pela vigésima vez, noto que testemunhei, edição após edição, o avanço enorme do estudo da obesidade em todos esses anos.

Abeso — Qual seria a mudança mais marcante em todo esse período?

Amélio Godoy-Matos — No passado, nos primeiros congressos,  progredíamos sem parar na compreensão da doença, mas o tratamento permanecia praticamente estagnado. Era essa a sensação. Vamos assumir: não tínhamos bons remédios. As medicações disponíveis baixavam muito pouco o peso e, com isso, não eram capazes de reduzir o risco implícito ao excesso de gordura corporal. Aliás, isso nos levou a um tremendo problema que, hoje, é talvez o maior desafio de quem trata a obesidade com responsabilidade e respeito.

Abeso Que problema seria esse?

Amélio Godoy-Matos — Como não havia medicamento efetivo para a obesidade, abriu-se uma brecha para profissionais sem compromisso verdadeiro com a saúde das pessoas indicarem fórmulas manipuladas, chás, suplementos para a perda de peso. Ou seja, eles se aproveitaram de uma lacuna — a falta de medicações com evidência científica para tratar uma doença séria — e passaram a vender promessas milagrosas e fazer fortuna. 

Abeso E o que o senhor acha que não mudou nesse tempo todo?

Amélio Godoy-Matos — Fácil responder! Desde os primeiros congressos, a gente tem a preocupação de mostrar que a obesidade é, como gostava de definir o meu colega Alfredo Halpern, uma doença que traz outras doenças, merecendo ser tratada da maneira mais correta e ética possível. Isso quer dizer: tratada com aquilo que a ciência sabe que é seguro e que poderá funcionar.  Nosso norte inegociável em todos os congressos é a evidência científica sempre. Quem participar do CBOSM 2023 ficará imerso na ciência da melhor qualidade. E, claro, irá ver que aquela realidade triste, de não ter alternativas reais para tratar o paciente, está mudando completamente. Temos novos remédios disponíveis e os congressistas ainda conhecerão outros que, felizmente, estão por vir.

Abeso Será, portanto, uma tremenda oportunidade de atualização científica…

Amélio Godoy-Matos —  Sem dúvida. Mas eu diria que o objetivo do CBOSM 2023 também é mostrar com maior profundidade os mecanismos fisiopatológicos da obesidade para jovens médicos e profissionais de outras áreas da saúde, para as que as novas gerações estejam mais aptas a lidar com esses pacientes. Temos em torno da metade da população brasileira com sobrepeso e cerca de 20% dela com obesidade. Precisamos de muito mais gente bem preparada para cuidar dessas pessoas.

E vou além: como uma sociedade médica não temos nenhuma outra arma a não ser ensinar. Não temos poder de polícia, de vigilância, nem de regulamentação. O poder de uma sociedade médica, como a Abeso, é de fato a educação e a promoção da ciência para não permitir a vitória das fake news e de supostos tratamentos para emagrecer sem um mínimo de fundamento.

Abeso Em que assuntos ou abordagens o senhor e os organizadores estão pensando nesse momento de montar a programação do evento?

Amélio Godoy-Matos —  Há uma riqueza de ideias e sugestões. Mas, se está me perguntando, eu particularmente acho muito importante aproveitarmos a ocasião para rever a ideia de que o sobrepeso e a obesidade são um problema exclusivo de quem tem um IMC maior do que 25 ou do que 30, respectivamente. Eu posso encontrar pessoas com obesidade e IMC normal, que seria o tal do magro metabolicamente obeso, com acúmulo de gordura visceral em regiões onde ela não é, digamos, esperada. Por exemplo, no epicárdio, levando ao risco de fibrilação atrial e de insuficiência cardíaca. 

Abeso Então a definição de obesidade está se ampliando e o congresso também falará disso?

Amélio Godoy-Matos — Onde quero chegar: a definição de obesidade não pode ser simplesmente antropométrica. Aliás, o estudo ELSA demonstrou muito bem isso, ao apontar de aproximadamente 50% dos indivíduos com peso normal tinham alterações preocupantes do metabolismo. O CBOSM 2023 deve trazer muito conteúdo sobre as complicações da síndrome metabólica. 

Abeso Já dá para adiantar algo sobre os convidados internacionais?

Amélio Godoy-Matos —  Por enquanto, o que posso dizer é que tão logo confirmamos a realização do congresso no Rio de Janeiro e a sua data, fizemos um convite ao Eric Ravussin, que é um brilhante professor de fisiologia humana e diretor do Nutritional Obesity Research Center  do Pennington Biomedical Research Center, nos Estados Unidos. Considerado um dos maiores pesquisadores da obesidade no mundo e amigo de  longa data de profissionais que fizeram a história da Abeso, Ravussin aceitou prontamente ser uma espécie de corresponde internacional do congresso. A ajuda dele será valiosa para o comitê científico organizar uma programação espetacular, trazendo pessoas importantes no cenário internacional do estudo da obesidade e muitos assuntos quentes. Ninguém perde por esperar o CBOSM 2023.

Aproveite e visite o site do evento para informações e inscrição clicando aqui.

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